Capítulo 13: Insistência

Zac

 

Assim que abri meus olhos naquela manhã eu tive que fechá-los na mesma hora. Como assim eu havia esquecido as cortinas de minhas janelas abertas? Coloquei o braços sobre eles, tentando bloquear a claridade que vinha lá de fora enquanto eu tentava me acostumar com a mesma lentamente.

Depois de algum tempo naquela posição, tirei o braço e encarei o teto acima de mim. Alguma coisa ali estava errada. Olhei de um lado para o outro e entendi exatamente o que era:

Eu não estava em casa.

O lençol bagunçado ao meu lado indicava que alguém havia passado a noite ao meu lado e foi nesse momento em que minha mente clareou e eu percebi: eu estava na casa de Megan.

Estalei a língua por ter desapontado à mim mesmo e balancei a cabeça como se não acreditasse que, mais uma vez, eu havia feito bobagem, mas agora o que eu podia fazer? Não adiantava nada chorar pelo leite derramado.

Me levantei e procurei por minhas roupas, das quais só encontrei a calça que estava jogada em um canto, de uma maneira nada carinhosa, pelo chão. A vesti e me encaminhei para fora do quarto, dando de cara com uma Megan com o cabelo totalmente bagunçado vestindo minha camisa – que ficava parecendo um vestido para ela -, sentada em uma poltrona em sua sala de estar. Nas mãos ela segurava uma caneca que emanava um cheiro fortíssimo de café e uma fumaça leve.

“Bom dia dorminhoco, eu já ia te acordar para ir trabalhar.”

Olhei para o relógio e vi que estávamos há meia hora de começar o expediente na empresa.

“Você não vai se arrumar?” Perguntei enquanto a olhava dos pés à cabeça.

“Já tomei meu banho, eu só vim fazer um café para tomarmos antes de começar o dia.” Ela sorria para mim de orelha à orelha e isso me incomodava muito.

“Bem, se não se importa…” Apontei para minha camisa que estava em seu corpo e esperei, afinal, eu precisava dela.

“Nem um pouco.” Megan se levantou da poltrona em que estava sentada, apoiou a caneca em cima da mesinha de centro e desabotoou um por um os botões da camisa que estava vestindo, despindo-se logo em seguida.

Se não fosse ela estar vestindo uma calcinha de renda na cor preta, eu poderia dizer que Megan havia ficado nua na minha frente.

“Megan… Por favor.” Peguei a camisa e me virei de costas enquanto a vestia. Eu não podia dizer que Megan não era uma mulher atraente, porque ela era, mas naquele momento eu só queria sair dali e esquecer da burrada que eu havia cometido mais uma vez.

Pensei no motivo de eu estar ali e a imagem de Allison brotou em minha mente como um relâmpago. Tinha sido por causa dela que eu havia ido parar ali.

Respirei fundo tentando tirar aqueles pensamentos de minha cabeça.

“Zac, você não está vendo nada do que já não tenha visto antes.” Senti suas mãos sobre minhas costas e então um beijo em meu pescoço, o que me fez arrepiar. Afinal, eu não era de ferro.

“Megan… Vá se arrumar.” Eu disse me virando e afastando suas mãos de cima de mim delicadamente.

Ela me olhou nos olhos e sorriu. Ela parecia estar feliz.

“Eu não demoro!” Anunciou e partiu em direção de seu quarto.

Dei uma olhada em volta da sala e procurei por algo que eu não sabia exatamente o que era. Tateei meus bolsos e percebi que minha carteira e minhas chaves estavam ali como na noite anterior.

Olhei para a garrafa de café em cima da bancada da cozinha e para o copo de alumínio com bocal dentro do armário de portas transparentes, o peguei e enchi daquele líquido milagroso. Nem ao menos dei uma golada no café pois a primeira coisa que eu tinha que fazer, era sair dali o quanto antes.

Antes que Megan me pegasse.

Nem pensar que eu chegaria junto com ela na empresa.

Calcei meus sapatos rapidamente e abri a porta, me livrando daquele apartamento logo em seguida, sem muito barulho.

Eu não queria ter que enfrentar o escândalo que Megan daria quando eu dissesse que não éramos para irmos juntos para o trabalho. E além do mais, eu não queria ter que explicar para ninguém o motivo de estar com as mesmas roupas de ontem, e era por isso que eu havia decidido passar em casa antes de ir, não importava o quanto eu me atrasasse.

Tomei meu café enquanto dirigia e consegui chegar em casa alguns minutos depois, indo correndo para o banheiro tomar um banho. Eu ouvia meu celular tocar sem parar e eu sabia exatamente quem era. Megan já havia me ligado umas cinco vezes desde que deixei sua casa naquela manhã.

Ela devia estar possessa por eu tê-la deixado sozinha sem dar qualquer explicação.

Tomei meu banho rapidamente, me arrumei e saí logo em seguida, não querendo me atrasar mais do que eu já estava atrasado. Decidi por fim ir de carro, ao contrário do que eu fazia todos os dias, pois assim eu chegaria mais rápido, porém imprevistos acontecem e o trânsito estava horrível por sabe Deus lá o motivo, o que só fez com que eu me atrasasse ainda mais.

Cheguei na garagem da W&F quase duas horas além de meu horário habitual, eu sabia que estaria encrencado e que eu teria que me explicar para Allison sobre meu atraso sem dar qualquer indício de que eu havia passado a noite fora. Um despertador que não tocou seria uma ótima desculpa, pensei.

 

Corri até o elevador e apertei o andar de número quinze, esperando impacientemente para que ele subisse todos aqueles andares sem demora. Eu odiava me atrasar e aquilo estava me deixando incrivelmente ansioso.

A primeira coisa que fiz assim que cheguei em meu setor foi cumprimentar Antonieta rapidamente e seguir direto para a sala de Allison.

“Allison, posso entrar?” Eu peguntei assim que bati em sua porta aberta.

“Entre, Zachary.”

Zachary. Pelo visto voltamos à estaca zero.

Entrei em sua sala e fiquei de pé à sua frente. Eu a encarava enquanto ela assinava alguns papéis sem sequer me olhar.

“Eu só queria dizer que infelizmente eu acabei me atrasando mas que já cheguei e se precisar de mim, estou em minha mesa.”

Eu disse curto e grosso como dizia minha avó e foi nesse momento que vi Allison virando seu olhar preocupado para mim.

“Você está bem?”

Franzi as sobrancelhas confuso. Como assim?

“Estou.”

Vi que ela assentiu com a cabeça e apertou os lábios.

“Espero que tenha conseguido pensar bastante ontem à noite.” Eu disse com a voz baixa sem tirar os olhos dela.

“Zac… Aqui não.”

Fui até a porta do aquário e a fechei. Eu não queria que ninguém ouvisse nossa conversa e pelo visto Allison também não.

“O que você pensa que está fazendo?”

“Não se incomode, eles pensarão que você está me dando um baita de um esporro por ter chegado atrasado.” Eu disse, me sentando na cadeira à sua frente.

“Zachary, eu já disse que aqui dentro nós não vamos conversar sobre o que aconteceu.”

“Você fica dizendo que aqui dentro não é lugar, mas você também não me dá uma chance lá fora, Allison.”

“Zachary, estamos em local de trabalho, por favor, volte para sua mesa.” Ela exigiu com a voz dura.

Respirei fundo, já nervoso o suficiente pelo fato de ela não estar cedendo.

“Ou quê, Allison? Você vai me demitir?” Eu disse de supetão, o que fez com que ela arregalasse os olhos de surpresa, não sei se pela ideia ou se por minha ousadia.

“Zachary…” Ela disse depois de um tempo.

“Hoje almoçamos juntos, te espero à uma e vamos conversar sobre nós.” Eu disse e me levantei, me virando de costas um momento depois para sair de sua sala. Hoje eu e Allison conversaríamos, ela querendo ou não.

***

O horário de saída chegava mas o horário de almoço não. Eu não estava com fome, mas a ansiedade pelo que estava por vir estava revirando meu estômago de uma maneira surpreendente.

Eu não sabia porque diabos eu estava me sentindo assim, mas o fato era, saber que eu e Allison conversaríamos sobre o que aconteceu entre nós na festa de casamento, só me fazia reviver aquele momento mais uma vez e minuto ou outro eu me pegava sorrindo pelos cantos.

É, aquele havia sido um beijo e tanto.

Olhei no relógio e verifiquei que faltavam apenas quinze minutos para uma da tarde quando vi que Allison fechava a porta atrás de si. Eu não deixaria ela escapar nem por reza brava.

Desliguei a tela de meu computador e me levantei com rapidez, a seguindo então pelos corredores da W&F.

Ela me olhou de canto de olhou e então me ignorou pelo caminho inteiro, no mínimo se sentia contrariada por ter sido intimada para o almoço do jeito que foi.

Passamos por Antonieta, que nos olhou com um sorriso meloso nos lábios e nos encaminhamos para o elevador, que se fechou atrás de nós assim que eu apertei o botão para a garagem.

“Vejo que aceitou meu convite para o almoço.”

“Convite, Zachary?” Ela me olhou praticamente revirando os olhos, fato que não dei muita importância.

“Se você não fugisse tanto de mim, Allison, tudo seria muito mais fácil.”

Ela bufou e então as portas se abriram.

“Garagem por quê?” Ela me perguntou e eu a peguei pela mão, guiando-a até meu carro.

“Almoçaremos em outro lugar hoje, bem longe da W&F para que você não invente desculpas para conversar comigo.”

Para minha surpresa ela não disse nada, simplesmente entrou em meu carro assim que o destravei.

No caminho, não tão longo, até o restaurante escolhido por mim não trocamos uma palavra sequer. Ela me ignorava o quanto podia e eu pensava em tudo o que falaria com ela, incluindo as coisas que a convenceria de que o fato de termos nos envolvido não era tão errado quanto ela pensava.

Assim que estacionei o carro, ela abriu a porta e saiu, me esperando encostada no carro. Travei o carro e fui até ela.

“Vamos?” Eu disse e a conduzi para dentro tocando suas costas, na altura da cintura, com uma das mãos.

O restaurante era calmo e bem aconchegante, tínhamos tempo o suficiente para pedirmos o que comer e conversar, o que era exatamente o que eu pretendia.

Depois de fazermos nossos pedidos ao garçom, a olhei e esperei que me olhasse também, mesmo que eu tivesse que vencê-la pelo cansaço.

“Ao contrário do que você me disse ontem, eu não estou arrependido do beijo que demos.” Soltei de vez, sem tempo sequer para gaguejar e vi quando seus olhos clarearam um pouco.

“Zac, você sabe que eu não quis dizer isso… Você sabe.”

“Então seja direta e me diga logo, você se arrepende?”

A resposta que veio à seguir não demorou nem sequer um segundo e foi o bastante para fazer com que meu coração parasse.

“Não.”

“Então…?”

“É só que a situação não ajuda, Zac. Você acha mesmo que eu teria te beijado se eu não quisesse? É claro que não, mas o fato de trabalharmos juntos e o pior, eu ser filha de quem sou…” Ela respirou fundo. “As pessoas esperam que eu seja perfeita, você me entende?”

Não respondi nada, apenas fiquei remoendo aquela informação.

“Você não entende, não é?” Ela me perguntou enquanto olhava para o próprio prato, mexendo nos talheres.

“Eu só queria que tudo fosse mais fácil. Porque nossa, depois daquele beijo tudo o que eu consigo pensar é o quanto eu queria que ele se repetisse.”

Allison me encarou com as sobrancelhas franzidas, acho que ela não esperava que eu dissesse aquilo com tanta sinceridade, pois logo depois corou.

O garçom chegou com nossos pedidos interrompendo que continuássemos o assunto por algum tempo o que, aparentemente, foi o suficiente para Allison se recompor.

“Não estou colocando empecilhos Zac, digo, não é culpa minha. E nós nos conhecemos a apenas alguns meses, foi bom pra mim também, eu só não sei se estamos dispostos a arriscar tanto por causa de um beijo.”

“E é por isso mesmo que a gente precisa se encontrar fora da empresa, pra gente se conhecer, para podermos conversar e decidir o que queremos de verdade. Não estou te pedindo em casamento Allie e ninguém precisa saber que nos vemos por ai.”

“Também não planejávamos que Antonieta nos encontrasse daquele jeito.”

“Não misture as coisas. Não planejamos nada do que aconteceu naquela noite, à partir daqui tomaremos as rédeas. Vai ficar tudo bem.”

Allison tinha a boca cheia e mastigava me olhando pensativa enquanto eu esperava ansioso por uma resposta e que ela fosse positiva dessa vez.

“Então…” Ela desviou o olhar com aquele jeito tímido que adotara comigo. “Qual o seu plano?”.

Sorri para ela. Eu estava contente. Era desse cartão verde que eu precisava.

Peguei em sua mão livre a acariciando.

“Confie em mim.”

“Mostre que eu posso confiar Zac.”

 

Ela entrelaçou os dedos nos meus e senti meu corpo gelar.

Mostre que eu posso confiar Zac. Eu sabia que aquela frase se repetiria muitas e muitas vezes em minha mente, e eu me lembrei automaticamente do que ocorrera na noite passada e um arrependimento desconhecido à mim, muito mais forte do que já sentira antes na vida me tomou. A vi me observando concentrada, talvez algo em minha expressão chamou sua atenção.

Quando observei seu rosto, os detalhes, o olhar, eu tive certeza que o que eu sentia quando nos olhávamos nos olhos era completamente novo também.

Ela me desestruturava por completo e isso era desesperador.

“Vou mostrar. Prometo Allison!”.

 

No caminho de volta seguimos listando nossos possíveis passeios para o fim de semana, uma vez que ela se mantinha resistente à ideia de que nos beijássemos tão perto dos olhos dos outros, nem sequer naquele restaurante em que estávamos sendo que ninguém na W&F o frequentava porque era longe e o preço nada acessível aos pobres mortais que éramos. Eu tentei usar todos os argumentos disponíveis, nada adiantou.

Talvez temesse por seu pai ou algum de seus subordinados diretos. Eu não entendia bem, mas à essa altura um encontro aos sábados era tudo o que eu tinha e teria de me contentar.

Ninguém acreditaria nisso, nenhum dos meus amigos me reconheceria. Eu esperando a boa vontade de uma garota. Onde já se viu?

“Podemos voltar àquele café,” Allison sugeriu enquanto analisava um dos folhetos jogados em meu porta-malas.

“Pra você se fechar em frente às pessoas como tem feito desde ontem?”

O próximo semáforo a minha frente se fechou, parei o carro e olhei para Allison que me fulminava com os olhos.

“Escuta, não me leve a mal. Eu quero ficar à sós com você ou ao menos à vontade. Nada de se preocupar se estão nos vendo ou o que farão quanto a isso”.

“Já estamos chegando, não quero mais que falemos sobre isso hoje ok? Pode me mandar mensagens à noite e então combinamos o que fazer.”

“Tudo bem.”

Virei na próxima esquina e lá estávamos nós novamente, dentro da garagem da W&F. Estacionei em minha vaga de sempre e a segurei pelo braço quando fez menção em sair.

“Allison…”

“Eu preciso subir, vou na frente e você vem um pouco depois certo?”

“Allie, eu… preciso… eu preciso… hã…”

“Desembucha!”

“Preciso te contar uma coisa.” Não sei onde estava com a cabeça com aquela ideia, mas eu simplesmente precisava me livrar de todo aquele peso que eu andava carregando nos últimos meses, eu precisava que ela soubesse mesmo que me odiasse pra sempre.

“Ei, o John está vindo, depois conversamos.”

Ela saiu o mais rápido possível e a vi disfarçando para que John não desconfiasse de nada. O garoto podia ser um perfeito idiota às vezes, mas dessa vez ele notou, ele entendeu que havia algo de errado. Agradeci aos céus por não ser Megan, poderia ser muito pior.

Desci do carro.

“John!”.

“Zac!”.

Balançamos a cabeça em cumprimento. Antes que ele desaparecesse de vista o chamei e vi seus olhos em mim.

“Você não viu nada ok?”.

Ele sorriu, eu não gostei daquele sorriso, era a merda da cara mais imbecil que eu já tinha visto.

“Ok.”

E éramos apenas os carros e eu. Não consegui me controlar sozinho. Doeu e acho que até amassou um pouco a lataria, mas dei um forte murro no capô de meu carro.

Eu só queria não ter me metido em nada daquilo.

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