Capítulo 16: Neblinas

Allison

 

Aquele sábado que eu e Zac passamos juntos fora maravilhoso e eu só conseguia ficar rindo à toa em todos os cantos de casa. Era incrível como algumas coisas funcionavam. Em alguns momentos, por mais maduros que somos, quando nos empolgamos com alguma coisa, sempre voltamos a nos sentir como adolescentes que acabaram de entrar na puberdade.

E era exatamente assim como eu me sentia. Eu me sentia como uma garota de quinze anos que havia acabado de dar seu primeiro beijo.

Borboletas faziam uma festa de arromba em meu estômago a cada minuto que eu parava para pensar naquela tarde que passamos juntos. Eu parecia flutuar.

Eu havia passado o domingo praticamente inteiro na casa de Samantha, que havia me chamado para almoçar ‘um prato especial’, de acordo com ela, mas que não passava de nada além de arroz com frango. Sam era um terror na cozinha, e eu não sabia porque ainda me deixava cair nessa conversinha dela.

Após almoçarmos, mandei uma mensagem para Zac, apenas para saber como ele estava. Não obtive resposta, então preferi não perturbar mais. Talvez ele pudesse estar longe do celular, ou quem sabe, o mesmo poderia estar descarregado, não é?

Tentei não me importar muito, afinal, eu queria também dar um tempo para ele. Não queria ficar controlando, alguém que nem me devia explicações. Voltei com o celular para dentro da bolsa enquanto Sam e eu nos divertíamos.

Jogamos alguns jogos de tabuleiro, conversamos sobre ela e Brady, e sobre Zac e eu, comemos algumas porcarias e bem no fim da tarde, resolvi ir embora, afinal, eu mal tinha parado em casa naquele final de semana.

Chegando em casa, vi que meu pai e meu irmão estavam na sala assistindo a um jogo, do qual não reconheci os times. Dei um beijo no rosto de cada um e me joguei no sofá ao lado de Peter.

“Não sabia que os encontraria em casa, ultimamente parece que sou a única habitante desse lugar”. Eu disse enquanto colocava a cabeça no ombro de meu irmão e o sentia me abraçar.

“A senhorita que quase não passou o final de semana em casa… Posso saber o por quê?” Meu pai me questionou sem sequer tirar os olhos da televisão, o que agradeci, afinal, dessa maneira ele não conseguia ver meu rosto completamente vermelho com a menção àqueles dias.

“Ahn… Passei a maioria do tempo na casa da Sam. Eu estava sentindo falta dela”.

Vi que meu irmão me olhou e então franziu a sobrancelha. Ele não tinha comprado a minha história. Mas afinal, eu não estava mentindo completamente, não é? Eu tinha passado o final de semana na casa de Sam, só não tinha passado lá o final de semana todo.

Me levantei do sofá para escapar de seus olhares e fui para a cozinha preparar um suco para nós. Eu queria aproveitar esse momento com meus dois homens preferidos e já que eu teria que dividir a atenção deles com a televisão, eu precisava, pelo menos, fazê-los beber alguma coisa que não fosse aquele vinho que estava ao lado de meu pai.

“Você não me engana”.

Ouvi a voz de Peter bem atrás de mim na cozinha. Eu disse, ele não havia comprado minha história nem a pau.

Me virei e o encontrei encostado no balcão enquanto me encarava.

“Não sei do que você está falando”.

“Você não passou o final de semana com a Samantha”.

“Quem disse que não?”.

“Eu seique não, Allie. Vai, desembucha”. Ele exigiu. Meu irmão me conhecia muito bem, até melhor do que nosso pai e eu não podia esconder nada dele, eu já sabia isso desde muito nova.

“Pet…”.

“Allie…”.

“Eu sai com um cara”. Resolvi soltar aquilo de vez. Uma hora ele descobriria e por que não contar logo agora? Além do mais, eu precisava de conselhos e ninguém melhor do que o Peter para me dá-los.

“Um cara, é? É o mesmo daquela vez?”.

Aquela vez?Peter realmente se lembrava de nossa conversa, nesse mesmo local, há algum tempo atrás?

“O próprio”.

“Então pelo visto, vejo que deu certo”.

“É… Mais ou menos. Ainda estou um pouco confusa em relação a ele”.

“Peter, você está perdendo um jogo incrível!” Ouvi meu pai gritar do sofá em uma animação sem tamanho.

“Já vou!” Ele disse e então se virou para mim. “Me conte.”

“Você já sentiu algo por alguém que achou não ser certo?”

“Allie…” Ele me olhou com uma cara, que me fez desistir da pergunta.

“Ok. Esse rapaz… Ele trabalha comigo.”

“Como assim ‘trabalha’ com você?”

“Ele trabalha em meu setor, Pet. Ele é meu subordinado. Pensa…”

“Sério?”

“É!”

“Mas você está tendo algo com ele, Allison? Ou só foi uma saída na inocência?” Ele olhou para mim e então riu. “Até parece, não é? Quem é? Eu conheço ele?”

“Calma, uma pergunta por vez.”

“Quem é?”

Olhei para além da porta e abaixei a voz. “O nome dele é Zachary… Zac. Trabalha no Setor de Artes comigo.”

“Hm…” Peter uniu as sobrancelhas como se estivesse tentando se lembrar. “Esse nome não me é estranho, mas não consigo ligá-lo à pessoa. Devo ter ouvido falar dele da última vez que fui lá.”

“É… E o caso é, não sei o que fazer. Ele trabalha para mim e Pet… Me ajuda.”

“Te ajudar no quê? Não tem no que te ajudar… Fica com o cara e vê até onde isso dá, Allie.”

“Mesmo ele sendo meu funcionário?”

“Você só não pode dar privilégios a ele”.

“Peter! Os Jets estão esmagando os Raiders. Corre!”

“Já estou indo, pai”. Ele disse e então voltou a me encarar. “Segue o que seu coração manda, Allie. Vê até onde dá”. Senti quando seus lábios tocaram minha testa e o vi voltar para a sala.

Suspirei fundo e terminei de preparar o suco, que fiz questão de entregar para meu pai e meu irmão, que mal deram uma golada.

Fui direto para meu quarto enquanto sentia meu coração apertado depois da conversa que tive com Peter. Zac ainda não havia sequer me respondido àquela mensagem e isso só fez com que meu estômago revirasse.

Tomei um banho relaxante e fui para debaixo das cobertas. Eu queria que aquele dia tivesse fim logo para que a segunda-feira chegasse e que eu pudesse pelo menos ver Zac na empresa.

Eu já sentia falta dele e era isso. Eu faria exatamente o que meu irmão havia me aconselhado.

Eu seguiria meu coração.

***

Depois de uma noite um pouco perturbada por pesadelos, a segunda-feira finalmente havia chegado, para minha felicidade. Eu estava louca para falar com Zac, que não havia respondido à minha mensagem até aquele momento, o que me deixou um pouco agoniada.

Olhei pela janela e vi que o dia havia amanhecido um pouco nublado, um contraste para aquele dia no parque com Zac. Eu não iria reclamar, eu realmente gostava de dias assim, mas normalmente eu sentia uma nostalgia que era inexplicável.

Me aprontei, tomei meu café sozinha – mais uma vez -, e segui para a empresa em meu carro, enquanto eu morria de ansiedade. Liguei o rádio, vendo as pessoas passarem apressada pelas calçadas enquanto puxavam seus casacos mais perto do pescoço, para espantarem o vento que havia começado a soprar. A música que tocava era bem propícia para aquele tempo, o que me fez desejar estar em casa, embaixo do edredom por um milésimo de segundo, até que me lembrei novamente de Zac e da proposta que havia me feito no sábado, quando nos despedíamos. Eu iria ou não para seu apartamento em nosso próximo encontro? Só de pensar na possibilidade, senti um frio percorrer minha barriga. Era melhor deixar para decidir isso depois, pensei.

Cheguei na W&F pouco tempo depois e fui direto para minha sala. A única funcionária que já estava lá era Antonieta, que sempre fazia questão de chegar antes de seu horário.

Olhei em meu relógio e vi que ainda faltavam vinte minutos para o horário de entrada do pessoal da produção, então eu teria que esperar.

Verifiquei meu celular e mais uma vez me deparei com várias mensagens e nenhuma delas era de Zac, o que me fez respirar fundo. Resolvi então passar o tempo lendo as mensagens que Samantha havia me mandado um pouco mais cedo. Às vezes ela simplesmente acordava, me mandava mensagens engraçadinhas de como ela poderia dormir nesse ‘tempo bom’ enquanto eu teria que vir trabalhar, e voltava a dormir. Sam era uma piada, e uma das melhores pessoas que já conheci em minha vida.

Olhei pela vidraça em minha frente e vi que Megan havia chegado. Sua cara não era uma das melhores. Era uma mistura de ansiedade com nervosismo. Dei de ombros e voltei a olhar para meu celular, Megan não queria cooperar em nossa convivência, então eu não iria forçá-la a nada e por isso decidi deixar para lá.

Alguns minutos depois passavam pela porta do elevador Paul, seguido então por Zac. Notei que sua expressão estava diferente da que tinha visto no parque no sábado. Aquela alegria que ele carregava havia sido trocada por uma feição carregada, tensa. Sua sobrancelha estava franzida, como se pensasse em algo que o desse dor de cabeça e ele tinha olheiras bem fundas.

Aquilo me preocupou, afinal, Zac não havia respondido minha mensagem, e sequer havia me ligado também, será que algo havia acontecido depois que ele me deixou com Sam? Será que era problema em sua família? Alguém havia morrido?

Paul me cumprimentou com um aceno pela vidraça enquanto Zac havia ido direto para sua mesa, sem sequer trocar um olhar comigo.

Algo havia acontecido, era certo.

“Está tudo bem?” Enviei essa mensagem para seu celular assim que ele se sentou em sua cadeira.

Vi o exato momento em que ele recebeu e leu a mensagem, pois enfim, ele havia olhado para mim. Percebi então que o olhar dele estava um pouco perdido… Confuso. E um sentimento ruim queimou meu coração. Zac passou a mão pelo cabelo nervosamente e apoiou o rosto em suas mãos, dando um suspiro profundo. Ele olhou para mim, de repente, e então se levantou de sua cadeira, como se tivesse decidido me falar o que se passava em sua cabeça.

Me ajeitei em frente de minha mesa enquanto o via vir caminhando em minha direção com uma folha em sua mão esquerda. A cada passo que ele dava, meu coração titubeava com mais vontade e parecia-me que o ar de meus pulmões acabaria de uma hora para outra.

“Posso entrar?”

“Claro, por favor”. Fiquei surpresa com o fato de minha voz sair naturalmente, pois não representava nem de longe como eu estava me sentindo.

“Vou ser breve, prometo.” Ele disse enquanto passava pela porta e a fechava atrás de si.

“O que está acontecendo, Zachary?”

“Aqui está minha carta de demissão. Estou me desligando da empresa, Allison”. Ele disse sem sequer me encarar, enquanto colocava a folha em minha frente.

“Sua car…” Pisquei uma ou duas vezes nervosamente enquanto processava a nova informação. “Como assim? Por que isso?”

Zac respirou fundo e então soltou a bomba. “Acho que o que a gente teve foi um erro que não deveria ter acontecido, Allison. Não podemos continuar com esse caso entre a gente e como não quero te prejudicar, estou indo embora da empresa.”

Meu coração foi ao chão e eu não sabia como responder.

“Você está brincando comigo, Zachary?” Senti meus olhos ficarem quentes enquanto eu tentava dar um meio sorriso, como se não quisesse cair em sua pegadinha de mau gosto.

“Estou falando muito sério, Allison. Não dá para a gente manter um relacionamento, então é melhor que a gente acabe com isso logo no início. Antes até que comece a ficar sério…” Continuou ainda encarando minha mesa onde sua carta se encontrava.

O arrependimento estava me pegando de uma maneira absurda e meu coração que já estava no chão há um tempo, agora estava sendo pisoteado por Zac, sem qualquer dó ou humanidade.

“Antes que comece a ficar sério…” Soltei um suspiro e um riso nervoso, era inacreditável. “Olha pra mim Zachary, diz que você não sentiu nada real por mim durante esses meses.”

Ele levantou o rosto, devagar, e quando os seus olhos finalmente encontraram os meus havia tristeza, um olhar muito diferente do que havia me dirigido apenas dois dias antes. Senti uma fraqueza estranha, mas resisti a vontade de me sentar em minha cadeira e sustentei seu olhar de volta.

“Foi um erro”. Ele concluiu.

Meus olhos começaram a queimar e a ficarem cheios de lágrimas. Aquilo só podia ser mentira das grandes. Como assim Zac havia brincado comigo, prometendo mundos e fundos para depois me dispensar como uma qualquer?

“Você está mentindo. Nem consegue dizer o que te pedi. Diz o que eu te pedi.”

“A gente só ficou, uma ou duas vezes. Não tem o porque você se importar com isso.”

Ele tratava aquilo como uma coisa normal, como se ele não tivesse feito com que um sentimento por ele nascesse dentro de mim, para que então quebrasse meu coração em pedaços. E nenhuma de suas palavras me convencia. Alguma coisa estava muito errada, mas o ambiente onde estávamos não me permitia questiona-lo muito mais.

Eu queria gritar, queria encher ele de porrada, mas eu tive que me controlar, o que estava me matando.

“Por favor, Allison. Não faça com que isso seja ainda mais difícil para mim.”

“Difícil para você? Você não está nem ligando para o que está falando. Não pensou nem antes em quais palavras usaria.” Senti uma lágrima rolar de meu rosto, o que fiz questão de esconder dele e de qualquer pessoa que pudesse olhar pelo vidro. Eu estava me sentindo desesperada, mas não podia demonstrar isso. “Vai embora, Zachary. Mandarei o RH assinar sua demissão. Vá embora e não volte nunca mais.” Acabei soltando a última frase um pouco mais alto do que eu esperava. Eu queria matar aquele mentiroso de uma figa.

“Allison…”

“SAI!” Eu disse a todo pulmão e então me virei para a enorme janela bem atrás de mim, onde pude ver que começava a chover na cidade de Nova York bem naquele exato momento. Aquele dia estava exatamente como meu coração, nublado e completamente despedaçado.

De costas para a porta, a ouvi se abrir e então se fechar um segundo depois. Sabendo que Zac havia partido, como eu tinha exigido que o fizesse, permaneci a olhar para aquela cidade que no momento estava totalmente sem alegria e sem cor. Bem como eu estava me sentindo. Algumas lágrimas teimosas rolaram por meu rosto e as limpei raivosamente com as costas das mãos. Eu não deixaria aquele pilantra acabar com o meu dia. Como assim ele havia me usado para saciar o desejo de pegar a chefe e depois podia me dispensar com tanta facilidade assim? Aquilo era desumano e imoral.

Peguei meu celular em cima de minha mesa e liguei para a pessoa da qual eu sabia que me receberia, não importava o horário.

“Quem me acorda?” Ouvi a voz de Samantha do outro lado da linha.

“Preciso de você. Preciso muito de você.”

“Allie, o que houve?” Sua voz parecia preocupada.

“Posso ir aí?”

“Já estou na porta te esperando.”

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