Capítulo 21: O que o futuro nos reserva

Zac

Depois de dois dias inteiros lutando contra mim mesmo e tentando decidir o que fazer após aquele encontro repentino com Allison, tentando cumprir minha promessa de não procurar mais por ela, eu segui o caminho mais estúpido que podia escolher. Só pra variar um pouco.

Olhando para aquele prédio enorme no qual eu trabalhei por um tempo de minha vida, eu só queria ter uma chance de vê-la novamente.

Nem que fosse rapidamente.

Pois pelo menos ali eu tinha certeza de que não teria a intervenção dolorosa de Peter, como da última vez.

Consultei o relógio, estava quase na hora do almoço. Peguei o celular e fiz a ligação para o número conhecido da mesa de minha antiga chefe pedindo aos céus que seu ramal não tivesse sido trocado.

“Watson & Fletcher, Allison.”

Minha respiração falhou. Por um momento eu mexia os lábios e o som não saia, achei que não conseguiria dizer coisa alguma até que, enfim, pude ouvir minha própria voz.

“Allison.” pronunciar o nome dela era o mais difícil, tentei acreditar que o restante viria de forma mais natural.

“O que você quer?”

Ela havia reconhecido minha voz.

Encostei em meu carro, de costas para ele, e olhei para o chão. Respirei fundo e fechei os olhos.

O que eu queria?

“Preciso ver você. Estou aqui embaixo e…”

“Zac, vai embora!” Me ordenou, interrompendo minha fala.

“Allie…”

“Não quero ver você!” Sua voz parecia decidida. Não tinha mais jeito, eu estava completamente perdido.

“Por favor.”

Eu estava vulnerável. Aquele tom de súplica em minha voz chegava a assustar a mim mesmo. Aquele que implorava a Allison por uma chance, não era o Zac de meses atrás. Definitivamente não!

A ouvi suspirar, triste, e ao mesmo tempo, preocupada.

“Droga, Zachary.”

E desligou.

Eu não sabia o que aquilo significava. Não sabia se ela desceria para me encontrar ou se simplesmente me ignoraria, mas de alguma maneira, eu não conseguia desgrudar os olhos da entrada do prédio enquanto uma esperança insistente me fazia acreditar que eu a veria a qualquer momento, e com isso, repeti em minha mente que nos próximos minutos ela apareceria ali, embora eu estivesse mesmo disposto a esperar por horas à fio se necessário.

Então ela surgiu.

Sua face dura vindo em direção a mim, como se quisesse me esfolar vivo. Já percebi de imediato que aquilo não seria fácil.

“Você disse que não iria mais me procurar. E mais uma vez eu acreditei em você.” Ela tinha uma raiva que eu nunca havia visto em seus olhos. “Você não tem mesmo escrúpulo algum, não é? E não me olhe com esse olhar de cachorro que caiu da mudança. Eu estou farta de você e de tudo o que você me fez!”

Um homem passou ao nosso lado nos olhando, provavelmente interessado no que aquela mulher exaltada faria a seguir ou qual seria minha reação àquilo tudo.

Peguei delicadamente em um dos braços de Allison e calmamente disse: “Pode me acompanhar? Não podemos continuar esse show aqui.”

Allison se soltou de meu braço bruscamente.

“O que mais você tem a dizer para mim? Pelo amor de Deus, não há mais nada a ser dito, Zachary.”

“Por favor, Allie.”

“Droga de ‘por favor Allie’”, disse me imitando na última parte. “Ainda caio nessa, idiota que sou!” Ela se encaminhou para a porta do lado do carona, a abriu e entrou fechando-a com força.

Entrei e sorri.

Eu não conseguia evitar. Seu olhar era raivoso e aquilo fazia com que eu me lembrasse da velha Allie, quando eu ainda tentava conquistá-la da primeira vez.

“Não me faça desistir, Zachary Hanson.”

***

“Fique a vontade em meu humilde apartamento,” abri a porta e ofereci que passasse em minha frente. A vi relutante a cada passo que dava. Entrei, a seguindo e fechando a porta. Logo atrás de mim.

“Sente-se.”

“Que irônico você me trazer aqui depois de tudo.” Ela disse ainda de pé enquanto mantinha os braços cruzados sobre o peito.

“Não diz o que você está pensando, é muita maldade.”

“O quê?” Sua sobrancelha se ergueu. “Que a sua intenção em me trazer aqui antes era só de ganhar aquela sua maldita aposta? É, acho que eu não sou a pessoa má aqui, não é?”

“Eu já te pedi desculpas por isso.”

“E disse que ia me deixar em paz, também. E cá estamos nós!”

Eu estava de pé frente à frente com Allison. Já que ela não sentaria, eu também não o faria.

“Eu não entendo você.”

“Então estamos na mesma, Zachary.”

Sorri sarcasticamente. Aquele jeito de me chamar…

“Por que está com aquele cara, Allie?”

“Você é ridículo.” Disse desviando o olhar de mim.

“Olhe pra mim.” Ela não olhou, então repeti. “Olhe pra mim, Allison. Diz olhando pra mim que você está feliz com aquele almofadinha do seu namorado.”

Quando Allison me olhou de volta eu tive a impressão de que ela choraria a qualquer momento.

“Você não devia se preocupar com isso. Não é mais da sua conta.”

“Você sabe que eu me importo. Allison, você sabe que sim. Que me arrependi de tudo o que fiz,” passei os dedos pelos fios de meus cabelos por puro nervosismo e então continuei. “Você sabe o que eu sinto por você.”

“Você não tem ideia da gravidade da coisa, tem Zac?” A primeira lágrima escorreu de seu rosto. “Meu irmão nunca vai perdoar você.”

“Ah, então seu irmão é o problema aqui? Sério mesmo?” Minha expressão era incrédula, era a coisa mais ridícula que eu poderia ouvir vindo dela.

“Zac, eu preciso defender você.”

“Eu não quero que você me defenda, Allison.” Me aproximei tentando um contato sendo então, empurrado por ela.

“Não encoste em mim.”

Insisti em tocá-la e quanto mais eu insistia, mais havia relutância de sua parte, que começou a dar murros em meu peito.

“Se acalma. Fica calma, Allison.” Segurei em seus punhos para que parasse de me bater e a abracei o mais forte que pude, e ela continuou a se debater por alguns segundos a mais, tentando se livrar de mim de qualquer jeito, mas não desisti e a trouxe para ainda mais perto de mim, fazendo com que cedesse, por fim.

Suas lágrimas molhavam minha camisa, e eu sentia seu soluçar forte enquanto acariciava seus cabelos, tentando acalmá-la.

Levantei seu rosto e passei os dedos com delicadeza, tirando todo o excesso de lágrimas e rímel que escorriam por suas bochechas.

“Eu amo você, Allison.”

“Pare! Não diga isso!”

Continuei a olhá-la, que soluçava mais a cada segundo que se passava e então puxei seu rosto mais para perto do meu e encostei meus lábios nos dela.

“Não faça isso, Zachary. Por favor, não faça!” Me advertiu entre meus lábios.

Assim que senti seus lábios completamente sobre os meus, recebi a mesma reação que ela teve em nosso primeiro beijo, enquanto aquela música tocava. Toda a insegurança e medo, unidas à vontade, estavam de volta.

Ela ainda resistia e ao mesmo tempo queria mais. Estava mais do que claro para mim que ela estava em uma briga interna consigo mesma e eu tinha certeza de que aquilo não devera ser fácil. Eu podia sentir isso tudo só pelo gosto salgado que tocava minha língua como inúmeras facas afiadas. As lágrimas de desespero, desejo e arrependimento estavam acabando comigo mais e mais a cada momento que se passava.

Eu jamais quis que ela sofresse, mas infelizmente fui burro demais para evitar que isso acontecesse.

A olhei assim que nos separamos e seus olhos deixaram transparecer toda a infelicidade que sentia naquele momento. A abracei e alisei seus cabelos como há muito não fazia, e então senti que meu coração queria sair pela boca.

Eu sentia falta daquilo.

Como eu pude ser tão idiota? Como pude perdê-la tão fácil, assim?

Trouxe Allison até o sofá e fiz com que se sentasse. Ela estava em pensamentos profundos e eu não queria ser aquele que havia interrompido aquilo. Resolvi então esperar até que ela decidisse falar alguma coisa. Para ela, eu tinha todo o tempo do mundo. Me sentei a seu lado enquanto segurava suas mãos, que tremiam.

“Quando você já estava desacordado, Zac, ele continuou batendo em você sem sequer se importar com as proporções que aquilo poderia tomar.” Ela limpou as lágrimas insistentes. “Se não fosse meu pai ter chegado bem na hora, eu não sei o que poderia ter acontecido com você.”

Ela estava desarmada, finalmente, e eu me sentia incrivelmente aliviado por isso. Mas ouvir sua referência àquele dia me fez voltar mentalmente a ele e a recordar toda a humilhação que passei, mesmo que não me arrependesse nem um pouco.

Coloquei meu rosto dentre as minhas mãos e Allison continuou.

“Depois disso , Peter ficou obcecado por mim. Queria sempre saber aonde eu ia, com quem ia e a que horas eu voltaria para casa. Ele passou a me espionar e eu já estava cansada disso. Além do mais, eu sabia que tudo isso tinha a ver com você e com o que aconteceu entre nós. E eu precisava distraí-lo, de alguma maneira.”

“Não vá me dizer que é ai que o almofadinha entra.”

“Ele é uma boa pessoa, Zac.” Puxou meu rosto para ficar frente a frente ao seu e o segurou com as duas mãos. “Já namoramos antes de você sequer pensar em entrar em minha vida. Ele não merece nada de ruim, na verdade, é bem ao contrário. Ele merece tudo do melhor. Eu não queria apenas usá-lo do modo como estou fazendo, eu queria mesmo era tentar levar o meu relacionamento com Kevin à sério, queria conseguir esquecer você de vez e ele parecia a melhor pessoa para tudo isso.”

“Kevin…” repeti pensativo. Um arrepio na coluna me atingiu só de imaginá-lo sequer a tocando de alguma maneira mais ousada.

“Então você reaparece e me desestrutura dessa maneira.” Deslizou um dos dedos sob minha sobrancelha direita. “Mas eu e você não podemos ficar juntos, entende? Você estragou tudo pra sempre.”

Eu não podia aceitar tão fácil que quem quer que fosse que pudesse decidir o restante de nossas vidas. Eu havia decidido que lutaria mais um pouco,  o quanto fosse necessário.

“Eu só preciso que você me diga que me perdoou, Allison e então, daremos um jeito nisso tudo.”

Ela tirou suas mãos de mim e ao mesmo momento trouxe-as para seu rosto.

“Você quer que eu te perdoe, Zac? Como eu posso perdoar alguém que apostou com o amigo que dormiria comigo, como se eu fosse um pedaço de carne qualquer? E o meu orgulho fica aonde?”

“Você não o ama.” Havia concluído apenas pelo o que pude ver naqueles breves segundos na praça. “Prefere se enganar à seguir seu coração, Allison? A deixar o seu orgulho de lado?”

“Eu prefiro e preciso proteger você do meu irmão.”

“EU NÃO PRECISO QUE VOCÊ ME PROTEJA, DROGA!” Eu disse a todo pulmão enquanto me levantava e rodava pelo centro da sala, o que fez com que Allison desse um pulo no sofá.

Percebi que eu havia ido longe demais quando vi seus olhos arregalados olhando em minha direção.

“Allison,” eu disse, me sentando a seu lado no sofá, novamente. “Eu não sei mais o que fazer. Me ajude. Eu estou enlouquecendo!”

“Você fez tudo isso acontecer.”

“Estou tentando desfazer.”

“Não é simples assim e não há mais futuro pra nós dois.” Ela estalou os dedos um a um visivelmente nervosa com suas palavras. “É justo que eu continue com o Kevin, que você siga bem a sua vida e deixe a minha família em paz, não acha?”

“Allie…”

“Eu só queria nunca ter te conhecido, Zac.”

Senti o peso daquelas palavras. Ela estava certa em tudo, eu não podia negar. Seria muito melhor se nossos caminhos não houvessem se cruzado, talvez eu nunca me apaixonasse daquela maneira e ela não seria obrigada a se sacrificar em nome de minha integridade física.

Aquilo tudo havia se transformado em uma enorme e branca bola de neve.

“Eu sinto muito.”

Minhas forças estavam se esvaindo. Eu queria persistir, queria convencê-la de que poderíamos transpor qualquer barreira e lutar por nós dois. Mas eu estava cansado mentalmente. O silêncio era incômodo, e eu me perguntava o que é que eu esperava a levando para aquela conversa. Eu me perguntava por que eu não havia cumprido a promessa de me manter longe dela. Mas ainda havia uma pergunta pendente que não poderia deixa-la ir sem que me respondesse. E havia minha última carta na manga também.

“Você me ama?”

Allison olhou em meus olhos, incrédula.

“Não está me perguntando isso. Não pode estar. Você não pode ser tão cara de pau e tão insensível assim.”

Ela se levantou novamente indo em direção à porta e a segurei pelo braço, fazendo-a olhar para mim, mais uma vez.

“Pare de fugir de mim todas as vezes que te pergunto algo, Allison. Eu não insistiria tanto se acreditasse que a resposta seria não, pode ter certeza disso.”

“Você está acostumado a todas essas mulheres caídas à seus pés e acha que comigo seria igual.”

“Dane-se as outras. Na verdade, eu nem sei de quem você está falando. Eu só tenho olhos para você. Entenda de uma vez. E então diz para mim. Seja sincera comigo, por favor, pois eu estou transbordando sinceridade aqui. E se você quiser mesmo falar sobre as minhas antigas atitudes, sinceridade não era uma das minhas práticas mais comuns, então acho que você deveria levar isso em consideração agora.”

“E se eu disser que amo você? E se eu disser que não?” Ela limpou outra lágrima que escorria. “O que é que vai acontecer, Zachary? Você acha que algo vai mudar? Não crie esperanças, pois nada vai mudar entre nós dois.”

Cheguei mais perto dela e encostei minha testa na sua.

“Eu recebi uma proposta de trabalho na Inglaterra, Allie. Eles me ligaram ontem finalmente me dando uma resposta positiva, eu só preciso resolver minhas coisas aqui e então embarcar em um avião diretamente para Londres. Então, se você me disser que não me ama ou que não sente nada por mim, eu faço minhas malas hoje mesmo e vou embora para nunca mais voltar. E dessa vez eu cumprirei todas as minhas promessas para você. Posso te garantir, se eu for, você não me verá mais.”

“Inglaterra?” Seu olhar estava perdido no meu.

“Basta uma palavra sua e eu fico.”

“Eu não sabia que isso estava em jogo.”

“Está. Eu não queria que parecesse uma ameaça para que você não me perdesse, por isso não disse nada antes.”

“Me desculpe, Zac…”

“Só diz. Diz que me ama.”

Ela acariciou meu rosto novamente e então me olhou nos olhos, que me mostraram toda sua fragilidade por trás de uma casca grossa que ela insistia em demonstrar. Seu queixo tremia e ela balançava sua cabeça de um lado para o outro rapidamente. De alguma maneira, eu já sabia o que aquilo significava.

“Vá viver sua vida. Aceite esse emprego e se mude. Será o melhor para nós dois.” Ela segurou meu queixo com uma das mãos e me trouxe para mais perto, enquanto plantava seus lábios sobre os meus e me dava um último beijo, antes de se virar e passar pela porta, fechando-a atrás de si.

Capítulo 22 >>

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